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Ela viralizou contando o que aprendeu sendo pobre estudando na FGV

Estudante de administração Gabrielly Sadovski viralizou no TikTok - Arquivo pessoal
Estudante de administração Gabrielly Sadovski viralizou no TikTok Imagem: Arquivo pessoal

Priscila Carvalho

Colaboração para Tilt

03/07/2021 04h00

A estudante Gabrielly Sadovski, 21 anos, viralizou no TikTok depois de compartilhar um vídeo contando como é ser bolsista na universidade particular FGV (Fundação Getúlio Vargas) São Paulo durante os quase quatro anos da graduação em administração pública. Moradora de Itaquera, na zona leste de São Paulo, Gabrielly conta que entrar nesse ambiente acadêmico foi um choque de realidade desde o início.

Na postagem, que já soma mais de 979 mil visualizações e 247,6 mil curtidas, ela brinca que saber inglês ou viajar para o exterior eram coisas básicas para a maioria dos alunos de sua sala —realidade bem diferente da que viveu sendo aluna em uma escola pública durante o ensino médio. "Eu nunca tinha conhecido alguém que saiu do país", lembra no vídeo.

Com poucas horas da publicação no ar, o conteúdo começou a ganhar força e trouxe diversos seguidores que se identificaram com a fala da universitária. Antes do viral no TikTok, Gabrielly tinha apenas 30 seguidores.

Após a postagem, em menos de dois dias, ela chegou a 17 mil. Até sexta-feira (2), somava mais de 26, 9 mil. "Quando postei, cheguei até pensar em apagar. Acabei deixando, depois foi crescendo e até meu namorado me ligou para avisar da proporção que estava tomando", diz Gabrielly a Tilt.

A estudante nunca imaginou que cresceria rapidamente e de forma orgânica em uma rede social. Segundo ela, o intuito da postagem era incentivar outros jovens de escola pública e bolsistas de que é possível entrar em uma faculdade renomada, mesmo não tendo tantos recursos financeiros.

"Recebi muitos comentários de pessoas dizendo que não se viam na universidade, e depois do vídeo se identificaram com o incentivo. E ainda disseram que começaram a olhar para o ensino superior como uma oportunidade", afirma.

Dificuldades no início do curso

Se deslocar até a faculdade todos os dias antes da pandemia (e das medidas de distanciamento social) era uma verdadeira viagem. De Itaquera, bairro periférico onde mora, até a unidade da FGV na Bela Vista (região central de São Paulo), ela leva entre 1h30 e 2h. O mesmo tempo era gasto na volta.

Além do desafio do deslocamento, Gabrielly também precisou se virar com os recursos tecnológicos para auxiliar nos estudos. Quando entrou na faculdade, a estudante tinha apenas um celular. Ela só conseguiu comprar um notebook graças a um prêmio que ganhou como melhor aluna em um curso de capacitação profissional para jovens baixa renda.

Se não fosse a ajuda financeira para adquirir o equipamento, não conseguiria seguir com a graduação, afirma a jovem. Ao receber o valor em dinheiro, além de comprar o computador, ela também pôde tirar pela primeira vez o seu passaporte.

"Eu lembro que todos os meus amigos na faculdade já tinham um Macbook [laptop da Apple que custa hoje a partir de R$ 12.999 na versão mais atual] — e eu nunca tinha visto um pessoalmente", conta. A mensalidade de seu curso gira em torno de R$ 5 mil.

Vídeos que mais bombaram

Depois do primeiro vídeo, Gabrielly começou a fazer postagens com "subtemas" relacionados à vivência dela na faculdade e respondendo perguntas dos seguidores. Os questionamentos são diversos: vão desde se ela tinha amigos ricos até quais foram as matérias mais legais durante o curso.

Em uma outra publicação, que também está viralizando dentro do TikTok e já conta com mais de 17 mil curtidas e 100 mil visualizações, ela responde como fazia para se manter financeiramente.

"Eu tinha passe livre e por isso conseguia transporte gratuito, mas como a faculdade era em período integral e não podia trabalhar, fazia estágios de férias nas empresas e guardava o dinheiro para os semestres seguintes", diz.

Depois do quarto ano, ela iniciou um estágio e conseguiu uma remuneração melhor.

Em um outro vídeo, publicado no último dia 28 intitulado "Eu não soube lidar", a estudante relata como sofreu um episódio de racismo durante a semana dos jogos universitários. Ela estava com algumas amigas — que eram brancas — e um aluno parou o carro perto das estudantes e pediu para falar com Gabrielly.

Ele questionou que horas fechava o alojamento do local. Incomodada, Gabrielly rebateu perguntando por que o estudante estava fazendo esse tipo de pergunta justamente para ela. A resposta dele foi: 'Você não trabalha aqui?'.

"Eu estava claramente com a roupa dos jogos, com glitter na cara e não tinha como confundir. Eu não tive reação", relembra.

Embora tenha passado por situações desagradáveis durante a graduação, a estudante diz que tem aprendido muito. "Teve muita identificação no vídeo. Alguns falaram que passaram por essas mesmas coisas tanto na escola quanto na faculdade."

Dicas gratuitas nas redes sociais

Gabrielly não tem pretensão de virar digital influencer. Para ela, os vídeos servem para incentivar outros jovens, mostrar que eles têm direito à educação. Além disso, ela vê nas redes sociais uma ferramenta importante na divulgação de conteúdos e dicas, principalmente para quem deseja ingressar em uma universidade conceituada e não sabe o caminho certo para isso.

A universitária destaca que em seu ambiente familiar nunca teve uma cultura de investir no estudo, fazendo com que ela precisasse ir atrás de informações e capacitação, na maioria das vezes, sozinha. "Tenho refletido muito sobre isso e quero poder dar oportunidade por meio das telas e ser transparente com as pessoas", ressalta.

Gabrielly diz ainda que não vai parar tão cedo com as postagens. Mas agora ela pretende fazer isso no exterior, já que foi aprovada em um estágio em administração na Corvinus University of Budapest, na Hungria. Para ajudar a concretizar essa oportunidade, a estudante está fazendo uma vaquinha no TikTok disponibilizando o seu pix. Ela pretende usar o dinheiro arrecadado para custear gastos fora do Brasil, explica, acrescentando que fará as prestações de contas para quem doar.

"Embarco agora em agosto e quero compartilhar tudo para que outras pessoas consigam o mesmo que eu. Vou usar minhas redes sociais para abrir um leque de possibilidades. A educação transforma a vida", conclui.